terça-feira, 24 de fevereiro de 2015

A ESCRITA INSONDÁVEL | Ensaio fotográfico




Muito mais do que ser um simples instrumento para reproduzir a realidade, a câmara fotográfica se converteu em um valioso meio pictórico. Nas mãos de um poeta – pois de poesia sempre se trata – as lentes se convertem no que André Breton chamou de “observatórios do céu interior”. Disto já sabiam bem os primeiros astrônomos imbuídos de hermetismo, que manipularam telescópios e microscópios, percebendo na imensidão a harmonia das esferas. O Romantismo descobriu as possibilidades poéticas que a fotografia acrescentava ao nosso conhecimento da realidade. Explico: emprego o verbo conhecer em seu sentido bíblico, que é o ponto de partida de Floriano Martins para reproduzir as composições que surgem magicamente do interior de seus aparados fotográficos.

Digamos então que os fluidos vitais de suas imagens correspondem a outras evidências, surpreendidas pelos surrealistas a partir da invenção do collage por Max Ernst. Como resultado daquela descoberta, a alquimia que também emprega a linguagem erótica se instaurou como um meio de intuir o que o véu da chamada realidade escondia. Para Floriano Martins as leis do funcionamento da fotografia, aparentemente inalteráveis, ficaram transgredidas da mesma maneira que sucedeu com a justaposição de realidades opostas nos collages do pintor nascido nas margens do Reno. Floriano Martins começa então sua longa e vigorosa exploração do mundo exterior correspondente com o interior, como sempre quiseram os discípulos de Hermes.

As fotos eróticas de Floriano Martins constituem, neste sentido, a expressão de uma arte que os alquimistas praticaram mediante suas permutações. Em seu caso a carnalidade das imagens nos brindam a chave de uma ars combinatória em vias de se transformar em ars amatoria, onde as zonas erógenas se mantêm em contato voluptuoso, ao mesmo tempo em que parecem sussurrar versos retirados da grande tradição da poesia amorosa de todos os tempos.

Carlos M. Luis





Mucho más que ser un simple instrumento para reproducir la realidad, la cámara fotográfica se ha convertido en un valioso medio pictórico. En manos de un poeta –pues de poesía siempre se trata- los lentes se convierten en lo que André Breton llamó “observatorios del cielo interior”. Eso lo sabían bien los primeros astrónomos imbuidos de hermetismo, que manipularon telescopios y microscopios, percibiendo en la inmensidad la armonía de las esferas. El Romanticismo descubrió las posibilidades poéticas que la fotografía le añadía a nuestro conocimiento de la realidad. Me explico: empleo el verbo conocer en su sentido bíblico, que es el punto de partida de Floriano Martins para reproducir las composiciones que surgen mágicamente del interior de sus aparatos fotográficos.

Digamos entonces que los fluidos vitales de sus imágenes corresponden a otras evidencias, sorprendidas por los surrealistas a partir de la invención del collage por Max Ernst. Como resultado de aquel descubrimiento, la alquimia que también emplea el lenguaje erótico, se instauró como un medio de intuir lo que el velo de la llamada realidad escondía. Para Floriano Martins las leyes del funcionamiento de la fotografía al parecer inalterables, quedaron transgredidas de la misma manera que sucediera con la yuxtaposición de realidades opuestas en los collages del pintor renano. Floriano Martins comienza entonces su larga y enjundiosa exploración del mundo exterior correspondiente con el interior, como siempre lo han querido los discípulos de Hermes.

Las fotos eróticas de Floriano Martins constituyen en ese sentido, la expresión de un arte que los alquimistas practicaron mediante sus permutaciones. En su caso la carnalidad de las imágenes nos brindan la clave de un “ars combinatoria” en vías de transformarse en “ars amatoria”, donde las zonas erógenas se mantienen en contacto voluptuoso, al mismo tiempo que parecen susurrar versos entresacados de la gran tradición de la poesía amorosa de todos los tiempos.

Carlos M. Luis







Far more than a simple instrument for replicating reality, the câmera has become a valuable pictorial medium. In the hands of a poet – as poetry is all-pervasive – the lenses turn into what André Breton called “observatories of the inner sky”. The early Hermetic astronomers knew this already, manipulating telescopes and microscopes, perceiving the harmony of the spheres in the vastness. Romanticism discovered the poetic possibilities that photography added to our knowledge of reality. Allow me to explain: I use the verb “to know” in its Biblical sense, which is Floriano Martins’s starting point to create the compositions that appear magically out of his photo clippings.

Let us say, then, that the vital fluids of his images correspond to other pieces of evidence Surrealists caught starting with Max Ernst’s invention of collage. As a result of their discovery, alchemy, which also relies on the erotic language, stood as a means to guess at what hid behind the veil of the so-called reality. For Floriano Martins, the apparently fixed laws of photography were breached in the same way that occurred with the juxtaposition of apparently opposite realities in the collages of the painter born on the banks of the Rhine. Floriano Martins thus begins his lengthy and vigorous exploration of the outside world in correspondence with the inner one, as the disciples of Hermes always wanted.

In this sense, Floriano Martins’s erotic photographs are the expression of an art that the alchemists practiced via their permutations. In his case, the flesh portrayed in the images give us the key to an ars combinatoria on the verge of becoming ars amatoria, where the erogenous zones remain voluptuously in touch even as they appear to whisper lines drawn from the tradition of the timeless poetry of love.

Carlos M. Luis









***


Carlos M. Luis (Cuba, 1932-2013). Poeta e artista plástico. Dirigiu em seu país o Museo Cubano. Como ensaísta, publicou Tránsito de la mirada (1991) e El oficio de la mirada (1998), além dos seguintes livros de poesia: Simulacro de lo Absoluto (1954), Entrada en la Semejanza (1965), e Nomadic and Archeological Texts (2009).






segunda-feira, 23 de fevereiro de 2015

FLORIANO MARTINS | Na mão de Adão cabem todos os sonhos



MOSTRA FOTOGRÁFICA
Curadoria | Jacob Klintowitz

Quem poderá saber quais novas galáxias Floriano Martins ainda inventará para apaziguar a sua curiosidade febril e aumentar a nossa surpresa e o nosso prazer?

Floriano Martins não é exatamente um fotógrafo, mas um inventor de imagens fotográficas. A máquina, o computador e o laboratório, são seus instrumentos, da mesma maneira que o pincel e o pigmento são instrumentos do pintor. Ele constrói minuciosos cenários, planeja todos os detalhes das cenas ao ar livre e, simultaneamente, se deixa conduzir pelo improviso, pelo que a paisagem, os modelos humanos e a sua imaginação, sugerem. É deste cadinho, que ferve substâncias variadas, que emergem estas encantadoras cenas. Ao mesmo tempo em que parecem infinitas em suas possibilidades de automodificação, estas fotografias têm uma inquietante estabilidade. Estas estranhas cenas e a sua inesperada beleza, vieram para ficar.



A misteriosa mão estendida, recoberta de barro, constituída de barro, mão cerâmica, tem um aspecto ancestral, como se viesse de tempos imemoriais. E é a marca desta série. Mesmo que cada foto seja independente em si mesmo, ainda assim a força da imagem da mão – intuímos que seja capaz de inventar e moldar – simboliza a capacidade de gerar e tornar os sonhos em ficções poéticas e objetivas.  

Mão feita de barro, como o mítico primeiro homem da nossa espécie, o homem feito de barro e animado pelo sopro. O pó da nossa matéria e a alma instalada pelo sopro divino. O barro queimado tornado homem cerâmico pelo vento ardente, o Pai Adão. É neste mito, e à semelhança do mito, onde navega a anima de Floriano. Ele mistura, combina, desconjunta, embaralha, estabelece relações entre imagens diversas e inventa novas visualidades.




E nem poderia ser diferente com a produção destas imagens. Floriano Martins é um criador incansável e múltiplo. Ele criou e dirigiu por 10 anos a Agulha Revista de Cultura, das mais lidas da língua portuguesa. E o Projeto Editorial Banda Hispânica, no qual estabeleceu um diálogo intenso entre as culturas dos vários países de língua espanhola. E é um profundo historiador do Surrealismo na América Latina.  E é um poeta editado em vários países. E um crítico de cultura, narrador, tradutor e autor de letras de canções com variados parceiros. 


Quem é Floriano Martins? Trata-se de um Mestre do Inusitado.









Na mão de Adão cabem todos os sonhos. Individual. Curadoria: Jacob Klintowitz.
Espaço Cultural Citi. São Paulo. Junho a agosto de 2012.



sexta-feira, 20 de fevereiro de 2015

IMPROVISACIÓN PARA DOS PIANOS | Floriano Martins y Farah Hallal


La memoria está tomada por dos asombros: el bautismo y el olvido.
Tu corazón reposa sobre el mío como si hubiera salido de una batalla.
Desnudo tu sombra, tu alma, los gestos con que me entregas la flor de tu pasión,
desvelo en tu cuerpo unos detalles de la alquimia más secreta de la vida.

FM & FH




1 | MIENTRAS TOCABA LA MÚSICA DE LA SANGRE

Tus ojos son todavía la fiebre del tiempo,
el ensayo del paso de las cosas por su memoria.
En su interior puedo recordar fascinado
el misterio de las cosas que no pasarán jamás.
Mientras evocas y trepas por el silencio de su iris
y cruzas lo frágil extendido en el interior de su espesura,
entonces comen los párpados lo aguerrido del recuerdo
y en la sombra de su oscuro rito desprecian lo necesario.

Lo cautivo que se traslada de un punto a otro
del domicilio de tu cuerpo. La botella convertida en lámpara.
El cielo desprendido del paisaje, con su teatro de riesgos.
Así como te escucho dentro de mí, llamándome:
con la voz paciente del silencio y sus laberintos de sal
huyendo hacia mí por el camino de un hecho inanimado
mordiéndome el labio superior de la conciencia,
ese que acaba humedeciendo el arco de la vida.

Y son también tus ojos la fiebre del espacio, el secreto
del horno y las alturas de las piedras que vuelan hasta aquí.
La liberación del sueño que contamos en tu piel.
La vegetación que cubre tus muslos antes que sea tarde.
Tan llenos de sí y, sin embargo, solos y custodiados:
luz del día que hambrienta acoge su secreta forma sangrante.

¡Han de soñar un día con la música del degolladero!
Y entonces se deshará la enredadera… Se comerán piedras,
las mismas que abren y cierran siempre de la mano,
como si fueran garras hermanadas en la misma sed,
garras ahogadas en su tintura que se extiende (en mí, en ti)
como alas de pájaros que se niegan a volar. Pero vuelan.




2 | MIENTRAS REHACEMOS EL FUTURO QUE DEJAMOS PASAR

El closet está vacío en la fiebre cautiva de una jornada del fuego.
Hasta las cortinas más invisibles ha arrancado de su biografía.
Las deudas predecibles y las hormigas como una mesa de estampados.
Las tareas predestinadas a lo triste se suspenden en lo saciado.
Dame tu mano que te llevo a buscar la otra joya del azar, la moneda
hecha de ventanas que conocen la frecuencia del oro del abismo.
Dame tu mano que te enseño a ver con los dedos de la noche,
con la transparencia de las aguas y la comunión de lo diáfano.
Porque está vacío también lo que alguna vez cubrió nuestra silueta.
¿Qué asalta ahora a nuestros inseguros estados del tiempo?
Mis lápices comen el vértice de los sueños de carboncillo
y con sus faldas de leña dejan escapar imprescindibles ondulaciones.
El amor moderno se enreda en los cables de su premura 
y en su tinta se ahogan los restos de este pasado, las escamas
de una noche y otra sucesibles mientras sudamos de deseo.
El amor es un monstruo nacido de una cópula de espejos.
Un pastel de imágenes, un empate de anzuelos en la carne roja.
Yo te quiero en mi ser como una transfiguración de caídas.
Un pescado servido en las aguas hirvientes de tus vértigos.
Hay que vaciar todo, el ropero del alma, los toneles del dolor,
el mismo canto del desierto antes que uno muera de sed.




3 | MIENTRAS DESCUBRE EL FUEGO COMO CAMINAR EN TUS COSTADOS

La noche cambia de sitio en tus manos.
Por veces busco tu nombre en mi piel.
Tu mirada traviesa deletrea otros sabores.
Una calentura de hierbas, una posesión
de mitos en los manjares de tu cocina.
Se acerca el fuego a mi almacén de pólvora.
Se acerca un latido veloz y una respiración
cortada con los cuchillos que guardo debajo 
de esa alfombra húmeda arqueada en la palabra.
Como si el tiempo fuera más que humo,
me acerco a la ciudad sitiada de tus muslos.
Yo te quiero más allá de tu leyenda, más allá
del destino que los dioses confían a tus pies.
Yo te quiero más allá de la noticia del diario,
de la mutua condición de humildes mortales.
Aún sin tiempo para amarnos demasiado,
duda y certeza expiran en nuestro calendario.
Y yo te quiero más allá del instante náufrago
donde algún día vimos rendido nuestro deseo.




4 | MIENTRAS LA NOCHE SE ALIMENTA DEL ESPÍRITU CREATIVO DE SUS SOMBRAS

He buscado el fulgor de un mundo invisible,
el abismo minucioso de las caídas, el dolor del aprendizaje
y sus cuidados con las lámparas del pasado.
¿Cómo nos reconocimos en el centelleo de estas palpitaciones?
¿Hasta qué punto eres un mundo indescifrable para mí?
¿Me bastarán los ojos para lamer de la luz de uno solo de tus días?
Nunca antes me vi con los bolsillos tan llenos de túneles.
Nunca antes me negué a verme desde esta silueta salpicada de sangre.
Y ahora todo cursa un tránsito nocturno en pleno meridiano. 
Todo tiene un nombre cruzando la frontera que nos une.
Y ya no sabes de mí lo que he esperado de ti la vida entera.




5 | MIENTRAS ESPERO QUE EL RELOJ COMA SUS HORAS U OLVIDE QUÉ HACER CON ELLAS

Mi libro de historia ya no tiene pasado,
una parte de mi se ha comido sus páginas.
Abro los brazos para planear como vuela la noche
y el ascenso de pájaro que a si mismo consume.
Hay en mi libro un camino de todo inalcanzable,
un poco lejos de nosotros, recordando los días 
que todavía no llegan con su sueño pasado en limpio.
La piedra revela el signo del pez en su entraña,
el sonido del agua que agita mis escombros.
Todo vuela en esta noche, y con mi música ciega
voy cantando al silencio que acoge mi cántaro.
Hay en mi libro un lomo de bestia agonizante,
un nido de imágenes que a mis nervios destrozan.
¿Dónde se han ido todos los besos que un día
he atrapado con mi red de cazar mariposas?
¿Dónde se han ido las aves que se cansaron
del esplendor del mismo tránsito libro afuera?
Bajo la ventana del abismo he pensado en ti.
Cuando te fuiste dejaste unas páginas rotas
y muchas otras con sus palabras desterradas.
Pero el libro vuelve a escribirse como incierto,
cosiendo sus orillas, desgajando la memoria.




6 | MIENTRAS LAS ARMAS NEGRAS DE LA MIRADA TRASBORDAN UNA PESADILLA DE SANGRE

¿Qué hubo con la noche que anduvo por acá? ¿Ha cambiado de lugar, como si ahora fuera otra la forma de su abandono? ¿Qué hubo con la línea de tiempo que mueve de sitio los efectos alucinógenos de la mirada? ¿Qué hacer con las preguntas cuando pierden sentido? Ellas circulan encerradas en su signo de incertidumbre. Con los fantasmas de las respuestas improbables en sus costados, ellas circulan como nosotros en un cuerpo prestado. En medio de la noche ha despertado su ruido nuestro juego de sombras. ¿Es oscuro el placer cuando nos muestra su ruina? ¿Es inocente la inquietud cuando derriba la casa? ¿Qué ha pasado con las monedas del espanto? Es otro el sonido de la caída de los errores en la máquina de desviar horizontes. Otro el desvarío de las horas que han llegado con retraso en el desván de su olvido. ¿Qué hacer con tantos sueños inundados de vigilia? ¿Cómo deshacerse de las mentiras inverosímiles?




7 | MIENTRAS EL ALMA BUSCA SUS BULTOS PERDIDOS BAJO LA PIEL DE LOS ESPEJOS

Como un laberinto figurado la noche recurre a tu cuerpo
relleno de escamas y la prosa oculta en tu deseo.
Enséñame el color de las plantas y cómo todo en el mundo
equivale a zambullirse en tu caos.
Quiéreme de la forma oscura en que las raíces aman su silencio.
Quiéreme aun mutilada en las extensiones de mi simulacro.
Todas mis líneas húmedas secaron su agonía esperando la mirada del sol.
Sus penas máximas, las conclusiones de su fe, el aroma del dolor recién cortado 
se enhebraron en el más solitario de todos mis dedos: ese que te señala.
Oh dime con tu posesión, ¿quién soy? ¿Cómo te escribes
en mi ser antes que yo misma perciba el calor de tus partes?
Puedo recordar la ruta de tus pies, el espinazo de tus gemidos, las arterias de tus sueños,
igual como puedo caminar por la piel de los espejos y el vientre de la luna, una noche más, y ya no estás.
Sabueso mi pasado vaga por las incertidumbres de tu anarquía.
Salta por las miserias que sirven de techo a las casuchas del hambre cotidiana,
consume las noticias de los diarios, las dibujadas con la forma del hueso.
¿Me darán los pies para cruzar de la que soy a la que fui?
Ahora no necesito más que salir de un mundo a otro, aunque disfrazada de huésped de los vértigos, ya no importa.
Preparo el tránsito de tu vivienda, la invisible cáscara de tus premisas,
y la semilla con que te haces mío mientras la eternidad se pierde en mis brazos.




8 | MIENTRAS EL ESCARNIO ABRE LAS PUERTAS DEL TEATRO EN LA NOCHE FRÍA

En la oscuridad el amor se parece embijado,
con sus calles rellenas de plagios y las plumas
impronunciables locas codiciadas por las sombras.
Hecho de ritos en desuso, el amor mascado por la tribu,
esforzado acostado sobre el monte,
con el tambor agotado de sus reverencias.
A mitad de camino yace la parte oscura del amor,
un cuerpo cansado de lamer su horizonte,
un brillo que lustra el abismo de sus zapatos,
dos manos heridas vaciando la noche.
A mitad de camino ya no se importa con nadie el amor.
Las cosas pasan por mi y aún no las puedo alcanzar.
La mirada de un dios rondando la tempestad,
la pipa de otro abortando mis ilusiones
y una palizada de calaveras reseñando el dolor.




9 | MIENTRAS LA SOLEDAD CAZA SUS MOTIVOS POR LA CASA VACÍA

He descubierto una noche perdida entre mis sueños,
una noche con sus piedras de colores insospechables
y una divinidad asombrada con sus poderes ya sin significado alguno.
He descubierto los restos mortales de mis pensamientos.
Así como un dios descubrió su manzana en la boca del hambre.

Los sueños logrados sembraron su dolor en la escasez de los maceteros
y desde entonces los santos y los milagros duermen en mis cicatrices.
Por eso he descubierto hoy la ausencia acumulada de las otras,
los calzados despoblados de cuerpos deambulando por un futuro inhóspito,
promisorio de vacío, como el diario que anuncia con sus pompas,
la luz sanguinaria de los días que apenas abrieron los ojos se comieron la ilusión del siglo.
Por eso la noche camina por las calles como si fuera su último acto,
y mi pecado tal vez sea el de haber reconocido los fantasmas
antes mismo del golpe mortal de sus rutineros extravíos, antes mismo
que la casa se convirtiera en un nido de llagas y el dolor se fuera de vez, por inútil.

He descubierto en mi vida una semblanza de vacíos que prosperan.




10 | MIENTRAS LOS DETALLES SINCEROS DESCASCAN SU PIEL BUSCANDO OTROS NOMBRES PARA EL MISMO RITO

Mi corazón necesita una tregua.
Ya conozco los fantasmas todos de la casa.
Sus trucos son como los músculos mecánicos del azar.
Y el mismo azar rompe los troncos flotantes del horizonte.
Las paredes blancas consumieron los paisajes
que de algún modo nos dibujaron.
Rincones rotos en lo volátil del latido.

Me desconoces casa. Todos tus objetos
-aun todos juntos- no definen mi forma primigenia.

Me desconoces casa. Todas tus ventanas
no son lo suficientemente anchas para dejar
que bailen los demonios como en una fiesta más allá del espacio.

Me desconoces casa. Todos tus caminos
no pueden con el abismo de las cosas invisibles
que nacen por todas partes de mi cuerpo.

Mi corazón necesita una síncopa, una letra menos
en su laberinto de fuegos. Yo te necesito,
sin que sepas la esencia de mis símbolos.



[Improvisación para dos pianos  2013, serie escrita al alimón. Ensayo fotográfico, 2015 Floriano Martins.]






IMPROVISO PARA DOIS PIANOS | Floriano Martins e Farah Hallal


 A memória está tomada por dois assombros: o batismo e o esquecimento.
Teu coração repousa sobre o meu como se tivesse saído de uma batalha.
Desnudo tua sombra, tua alma, os gestos com que me entregas a flor de tua paixão,
desvelo em teu corpo uns detalhes da alquimia mais secreta da vida.

FM & FH




1 | ENQUANTO TOCAVA A MÚSICA DO SANGUE

Teus olhos são ainda a febre do tempo,
o ensaio da passagem das coisas por sua memória.
Em seu interior posso recordar fascinado
o mistério das coisas que jamais ocorrerão.
Enquanto evocas e sobes pelo silêncio de sua íris
e cruzas o frágil estendido no interior de sua espessura,
comem então as pálpebras o aguerrido da lembrança
e na sombra de seu escuro rito desprezam o necessário.

O cativo que se traslada de um ponto a outro
do domicílio de teu corpo. A garrafa convertida em lâmpada.
O céu desprendido da paisagem, com seu teatro de riscos.
Assim como eu te escuto dentro de mim, chamando-me:
com a voz paciente do silêncio e seus labirintos de sal
fugindo até mim pelo caminho de um fato inanimado,
mordendo-me o lábio superior da consciência,
esse que acaba umedecendo o arco da vida.

E são também teus olhos a febre do espaço, o segredo
do forno e as alturas das pedras que voam até aqui.
A liberação do sonho que contamos em tua pele.
A vegetação que cobre tuas coxas antes que seja tarde.
Tão cheios de si e, no entanto, solitários e sob custódia:
luz do dia que acolhe faminta sua secreta forma sangrenta.

Um dia haverão de sonhar com a música do cadafalso!
E então se desfará a enredadeira… Comerão pedras,
as mesmas que abrem e fecham sempre a mão,
como se fossem garras irmanadas na própria sede,
garras afogadas em sua tintura que se estende (em mim, em ti)
como asas de pássaros que se negam a voar. Porém voam.




2 | ENQUANTO REFAZEMOS O FUTURO QUE DEIXAMOS PASSAR

O closet está vazio na febre cativa de uma jornada do fogo.
Arrancou de sua biografia até mesmo as cortinas mais invisíveis.
As dúvidas previsíveis e as formigas como uma mesa de estampados.
As tarefas predestinadas às tristeza são suspensas na saciedade.
Dá-me tua mão que eu te levo a buscar a outra joia do acaso, a moeda
feita de janelas que conhecem a frequência do ouro do abismo.
Dá-me tua mão que eu te ensino a ver com os dedos da noite,
com a transparência das águas e a comunhão do diáfano.
Porque igualmente vazio está o que alguma vez cobriu nossa silhueta.
O que assalta agora nossos inseguros estados do tempo?
Meus lápis comem o vértice dos sonhos de carvãozinho
e com suas fraldas de lenha deixam escapar imprescindíveis ondulações.
O amor moderno se enreda nos cabos de sua pressa
e em sua tinta se afogam os restos deste passado, as escamas
de uma noite e outra sucessíveis enquanto suamos de desejo.
O amor é um monstro nascido de uma cópula de espelhos.
Um pastel de imagens, uma transa de anzóis na carne vermelha.
Eu te quero em meu ser como uma transfiguração de quedas.
Um peixe servido nas águas ferventes de tuas vertigens.
Há que esvaziar tudo, o roupeiro da alma, os tonéis da dor,
o próprio canto do deserto, antes que alguém morra de sede.




3 | ENQUANTO O FOGO DESCOBRE COMO CAMINHAR EM TEU DORSO

A noite muda de lugar em tuas mãos.
Por vezes busco teu nome em minha pele.
Teu olhar travesso soletra outros sabores.
Uma quentura de ervas, uma possessão
de mitos nos manjares de tua cozinha.
O fogo se aproxima de meu armazém de pólvora.
Com um latejo veloz e uma respiração
cortada com as facas que guardo debaixo
dessa almofada úmida arqueada na palavra.
Como se o tempo fosse mais do que fumaça,
eu me aproximo da cidade sitiada de tuas coxas.
Muito além de tua lenda, eu te quero, muito além
do destino que os deuses confiam a teus pés.
Eu te quero muito além da notícia do jornal,
da mútua condição de humildes mortais.
Mesmo sem tempo para nos amarmos demasiado,
dúvida e certeza expiram em nosso calendário.
E eu te quero muito além do instante náufrago
onde algum dia vimos rendido nosso desejo.




4 | ENQUANTO A NOITE SE ALIMENTA DO ESPÍRITO CRIATIVO DE SUAS SOMBRAS

Tenho buscado o fulgor de um mundo invisível,
o abismo minucioso das quedas, a dor da aprendizagem
e seus cuidados com as lâmpadas do passado.
Como nos reconhecemos na cintilação dessas palpitações?
Até que ponto és um mundo indescritível para mim?
Os olhos me bastarão para lamber a luz de um só de teus dias?
Nunca antes me vi com os bolsos tão repletos de túneis.
Jamais havia me negado a ver a mim mesmo desde esta silhueta salpicada de sangue.
E agora tudo cursa um trânsito noturno em pleno meridiano.
Tudo tem um nome cruzando a fronteira que nos une.
E já não sabes de mim o que esperei de ti a vida inteira.




5 | ENQUANTO ESPERO QUE O RELÓGIO COMA SUAS HORAS OU ESQUEÇA O QUE FAZER COM ELAS

Meu livro de história já não tem passado,
uma parte de mim comeu suas páginas.
Abro os braços para planejar como voa a noite
e a subida do pássaro que consome a si mesmo.
Há em meu livro um caminho de todo inatingível,
um pouco longe de nós, recordando os dias
que ainda não chegam com seu sonho passado a limpo.
A pedra revela o signo do peixe em sua entranha,
o som da água que agita meus escombros.
Tudo voa nesta noite, e com a minha música cega
vou cantando ao silêncio que acolhe meu cântaro.
Há em meu livro um lombo de besta agonizante,
um ninho de imagens que destroçam meus nervos.
Para onde foram todos os beijos que um dia
peguei com a minha rede de caçar borboletas?
Para onde foram as aves que se cansaram
do esplendor do próprio trânsito livro afora?
Sob a janela do abismo tenho pensado em ti.
Quando te foste deixaste rasgadas umas páginas
e muitas outras com suas palavras desterradas.
Porém o livro volta a escrever-se como incerto,
costurando suas margens, desgalhando a memória.




6 | ENQUANTO AS ARMAS NEGRAS DO OLHAR TRANSBORDAM UM PESADELO DE SANGUE

O que houve com a noite que andou por aqui?  Mudou de lugar, como se agora fosse outra a forma de seu abandono? O que houve com a linha de tempo que muda de lugar os efeitos alucinógenos do olhar? O que fazer com as perguntas quando perdem sentido? Elas circulam encerradas em seu signo de incerteza. Com o fantasma das respostas improváveis em suas costas, elas circulam como nós em um corpo emprestado. No meio da noite nosso jogo de sombras despertou seu ruído. É obscuro o prazer quando nos mostra sua ruína? É inocente a inquietude quando derruba a casa? O que houve com as moedas do espanto? É outro o som da queda dos erros na máquina de desviar horizontes. Outro o desvario das horas que chegaram com atraso no desvão de seu esquecimento. O que fazer com tantos sonhos inundados na vigília? Como desfazer-se das mentiras inverossímeis?




7 | ENQUANTO A ALMA BUSCA SEUS VULTOS PERDIDOS SOB A PELE DOS ESPELHOS

Como um labirinto figurado a noite recorre a teu corpo
repleto de escamas e à prosa oculta em teu desejo.
Mostra-me a cor das plantas e como tudo no mundo
equivale a mergulhar em teu caos.
Sei que me queres da forma obscura em que as raízes amam seu silêncio,
que me queres ainda mutilada nas extensões de meu simulacro.
Todas as minhas linhas úmidas secaram sua agonia esperando o olhar do sol.
Suas penas máximas, as conclusões de sua fé, o aroma da dor recém cortada
se enfiaram no mais solitário de todos os meus dedos: esse que te aponta.
Oh me diz com tua possessão, quem sou? Como te escreves
em meu ser antes que eu mesma perceba o calor de tuas partes?
Posso recordar a rota de teu pés, o espinhaço de teus gemidos as artérias de teus sonhos,
da mesma forma como posso caminhar sobre a pele dos espelhos e o ventre da lua, uma noite mais, e já não estás.
Como um sabujo meu passado vaga pelas incertezas de tua anarquia.
Salta pelas misérias que servem de teto para as choupanas da fome cotidiana,
consome as notícias dos jornais, aquelas desenhadas com a forma do osso.
Acaso elas me darão os pés para cruzar da que sou até a que fui?
Agora não necessito mais do que sair de um mundo a outro, embora disfarçada de hóspede das vertigens, já não importa.
Preparo o trânsito de tua vivenda, a casca invisível de tuas premissas,
e a semente com que te fazes meu enquanto a eternidade se perde em meus braços.




8 | ENQUANTO O ESCÁRNIO ABRE AS PORTAS DO TEATRO NA NOITE FRIA

Na escuridão o amor parece desigual,
com suas ruas repletas de plágios e as plumas
impronunciáveis loucas cobiçadas pelas sombras.
Feito de ritos em desuso, o amor mascado pela tribo,
esforçado recostado sobre a montanha,
com o tambor esgotado de suas reverências.
Na metade do caminho jaz a parte escura do amor,
um corpo cansado de lamber seu horizonte,
um brilho que lustra o abismo de seus sapatos,
duas mãos feridas esvaziando a noite.
Na metade do caminho o amor já não se importa com ninguém.
As coisas passam por mim e ainda não as posso alcançar.
O olhar de um deus rondando a tempestade,
o cachimbo de outro abortando minhas ilusões
e uma paliçada de caveiras resenhando a dor.




9 | ENQUANTO A SOLIDÃO CAÇA SEUS MOTIVOS PELA CASA VAZIA

Descobri uma noite perdida entre meus sonhos,
uma noite com suas pedras de cores insuspeitadas
e uma divindade assombrada com seus poderes já sem significado algum.
Descobri os restos mortais de meus pensamentos.
Assim como um deus descobriu sua maçã na boca da fome.

Os sonhos alcançados semearam sua dor na escassez dos potes
e desde então os santos e os milagres dormem em minhas cicatrizes.
Por isto hoje descobri a ausência acumulada das outras,
os calçados desocupados de corpos perambulando por um futuro inóspito,
promissor de vazio, como o jornal que anuncia com suas pompas
a luz sanguinária dos dias que mal abriram os olhos comeram a ilusão do século.
Por isto a noite caminha pelas ruas como se fosse seu último ato,
e meu pecado talvez seja o de haver reconhecido os fantasmas
antes mesmo do golpe mortal de seus rotineiros extravios, antes mesmo
que a casa se convertesse em um ninho de chagas e a dor se fosse de vez, por inútil.

Descobri em minha vida um semblante de vazios que prosperam.




10 | ENQUANTO OS DETALHES SINCEROS DESCASCAM SUA PELE À PROCURA DE OUTROS NOMES PARA O MESMO RITO

Meu coração necessita uma trégua.
Já conheço os fantasmas todos da casa.
Seus truques são como os músculos mecânicos do acaso.
E o próprio acaso rompe os troncos flutuantes do horizonte.
As paredes brancas consumiram as paisagens
que de algum modo nos foram desenhadas.
Recantos destroçados na inconstância do latejo.

Me desconheces, casa. Os teus objetos todos
- mesmo todos juntos - não definem minha forma primogênita.

Me desconheces, casa. As tuas janelas todas
não são suficientemente amplas para deixar
que dancem os demônios como em u festa muito além do espaço.

Me desconheces, casa. Os teu caminhos todos
não podem com o abismo das coisas invisíveis
que nasce por todas as partes de meu corpo.

Meu coração necessita uma síncope, uma letra a menos
em seu labirinto de fogos. Eu te necessito,
sem que saibas a essência de meus símbolos.




[Improvisación para dos pianos ₢ 2013, série escrita a quatro mãos, originalmente em espanhol. Tradução ao português e ensaio fotográfico, 2015 ₢ Floriano Martins.]